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Despedimo-nos à porta do rés-do-chão. Pierre rejeitou veementemente a oferta do sofá para dormir e acompanharia Zoe a casa àquelas horas da noite. As cidades já não eram seguras de dia, muito menos de madrugada. Qualquer rufia, pervertido ou doido podia abordar Zoe com más intenções e se Pierre não tivesse inicialmente oferecido para a acompanhar eu próprio a acompanharia.
Ficou a promessa de um encontro posterior. Pierre fazia viagens com frequência a Inglaterra e prometeu passar em minha casa em breve.
Vi-os afastarem-se pela janela do quarto enquanto me preparava para dormir.
Estava cansado. Muito cansado, como se tivesse corrido uma maratona e a cama absorvia todos os meus pensamentos e sugava-me para o conforto dos lençóis macios e quentes. De noite a humidade e o frio faziam-se sentir naquele apartamento que digámos que do sistema de aquecimento pouco sobrava. Dacia já estava deitada na cama, enroscada sobre si própria totalmente ensonada. Eu contemplava a figura do casal que se afastava já longe da minha visão ao mesmo tempo que um arrepio percorreu-me a espinha, algo não estava certo, mas estava demasiado cansado para sequer pensar nisso, olhei para o céu. Não havia estrelas, no entanto via a Lua por entre duas nuvens momentaneamente afastadas e vislumbrei-a branca, morta de vida e senti o vazio, o espaço, aquele sentimento de solidão de quem sabe perfeitamente que não passa da cabeça de um alfinete num campo de futebol.
Corri os cortinados atenuando um pouco a luz que vinha do candeeiro da rua. Deitei-me de barriga para o ar e esperei pelo sono. Não demorou muito, mas não foi o sono de cansaço que eu esperava relaxante e calmo, pelo contrário. Foi inquieto com sonhos de núvens e céus turvos que envolviam a vida de figuras bruxuleantes que andavam à deriva num mar de terra.
Dormi, inquieto com uma dor de cabeça e pareceu-me ver as horas no despertador passar devagar como que um sonho, porque dormia embora a relação entre estar acordado e sonhar possa muitas vezes parecer ténue ao ponto de não sabermos onde estámos e eu estava nesse estado. Embora cansado e cheio de sono não sabia se estava acordado ou a dormir.
De repente fui acordado por um bater apressado e insistente na porta.
- Ah, quem diabo seria a estas horas? - injuriei eu irritado por ter sido acordado.
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